segunda-feira, 9 de março de 2009

Simonal e a Shell

Simonal assinando o contrato com a Shell. Fonte: OESP, 17/09/1969.


Impressionada com a popularidade do cantor, a Shell resolveu contratá-lo como garoto propaganda de seus produtos, que iam de combustíveis a formicidas. João Carlos Magaldi, gerente de marketing da Shell, ofereceu NCr$ 300 milhões durante um ano para que o cantor tivesse sua imagem vinculada à multinacional. Assim, Simonal passou a aparecer freqüentemente em comerciais de TV, e ao lado dos astros da Seleção Brasileira de Futebol em jornais e revistas. Em 1969, a Shell se tornara patrocinadora da Seleção, aproveitando a crise que vivia o time do então técnico João Saldanha. A seleção brasileira de Saldanha havia se classificado com folga nas eliminatórias, mas na fase de amistosos preparatórios para a Copa o time sofreu algumas derrotas humilhantes em jogos considerados bobos, nos quais o time inteiro jogou mal.[*]
Além de muito popular, Simonal era um showman reconhecido por vários artistas da época. Juca Chaves, Chacrinha e Jô Soares o consideravam o melhor cantor do Brasil.[1] Embora a maioria dos artistas reconhecesse seu talento, criticavam as “besteiras” que ele cantou ao longo de sua carreira, especialmente as canções ligadas ao seu projeto estético, a Pilantragem. Vinícius de Moraes chegou a dizer que daria nota 10 para o cantor que ele poderia ser se não tivesse aderido à “bobagem” da pilantragem.[2] Roberto Carlos o considerava um dos três maiores cantores do Brasil, ao lado do ‘deus’ daquela geração, João Gilberto. Mas o “rei” fazia ressalvas: “Simonal é muito bom, [mas] eu não estou me referindo ao gênero pilantragem não, mas ao Simonal como cantor, cantando outro tipo de música.”[3] Essa opinião preconceituosa soa estranha na voz de Roberto Carlos, já que ele próprio sofreu perseguição dos puristas da música popular contrários ao iê-iê-iê brasileiro.

Nara Leão também ridicularizava a pilantragem,[4] mas concordava com Norma Benguell que sua voz era fenomenal: “nota 3 para a pilantragem e 5 para Simonal, pois ele é musical paca mas fica naquele negócio de meu limão meu limoeiro, não dá”.[5]

O que todos reconheciam era que sua fama era enorme, talvez só comparável à de Roberto Carlos. A partir de 1966, ele se tornou um dos maiores vendedores de discos, disputando com o “rei” e com outros artistas recordistas de vendas, como Agnaldo Timóteo e Paulo Sérgio, o mercado nacional de compactos e long plays, os vinis da época. Embora gerasse algumas desavenças no meio artístico, Simonal era reconhecido pelo povão. Numa pesquisa realizada pelo Ibope no Rio de Janeiro em novembro de 1969, ele foi considerado o terceiro cantor mais popular do país. Ficou atrás apenas de Roberto Carlos e Agnaldo Timóteo.[6]

[*] A primeira dessas derrotas humilhantes foi para o time do Atlético Mineiro (2x0, em Belo Horizonte em 3/9/1969); a segunda para a Argentina (2x0, em Porto Alegre em 4/3/1970). A crise se abateu na seleção quando Saldanha afirmou que Pelé tinha um problema na vista. Por fim, o técnico, simpatizante do então extinto Partido Comunista, respondeu grosseiramente a sugestão do presidente Médici de convocar o atacante Dario no lugar de Tostão (este sim com problema ocular: descolamento de retina): “Eu não opino na escolha do seu ministério, portanto não aceito que o senhor dê palpites no meu time.” Saldanha foi trocado por Mario Jorge Lobo Zagallo a menos de 60 dias do início da competição. João Máximo, João Saldanha (Coleção Perfis do Rio), Rio de Janeiro, Relume Dumará, 1996, pp. 103-113.
[1] Para as opiniões de Jô Soares, Juca Chaves e Chacrinha ver entrevistas ao jornal O Pasquim: Jô Soares, 4-10/12/1969, s/nº, pp. 10-13; Juca Chaves, 18/12/1969, nº 26, páginas 8-11; Chacrinha, O Pasquim, 13-19/11/1969, nº 21, pp. 10-13.
[2] Para a entrevista de Vinícius de Moraes ver O Pasquim, ago. 1969, nº6, p. 8.
[3] Roberto Carlos, O Pasquim, 7/10/1970, nº 68, pp. 8-11.
[4] Nara Leão, O Pasquim, ago. 1969, nº 7, p. 10.
[5] Norma Benguel, O Pasquim, 5/9/1969, s/nº, p. 11.
[6] Pesquisa Ibope de novembro de 1969 (Cantores Brasileiros – popularidade – 1624 1964-1969, vol. 1, p. 7, Acervo Edgar Leuenroth, IFCH – Unicamp).